quinta-feira, 7 de agosto de 2025

Carta para alguém ou para ninguém

 Talvez nunca tenha coragem ou até mesmo vontade de te enviar essa carta. Ou quem sabe essas linhas sejam para mim e não para você – não importa.

Mas o fato é que não sei em que momento perdi o tempo do tempo.

Sai estava tudo arrumado, organizado e quando voltei e abri a porta lembrei de Adélia Prado em Dona Doida, só que dessa vez a doida era eu, sem ao menos saber que era.

As paredes mudaram de cor, o ar estava mais denso, desfeito, e um pouco antes de sufocar, já com as mãos em volta do pescoço - entendi que puxava a respiração ao contrário, não era de fora que precisava buscar o sopro do mundo para me sustentar – e sim de dentro de mim.

Corri dali o mais rápido que pude, fugi como vento que escapa por uma fresta com medo de ser detido. Quando meu coração se aquietou no peito parei – olhei para trás por cima dos ombros, todos se movimentavam no ritmo da nova música que começou a tocar após minha partida. Ninguém se virou a minha busca, será que não deram por minha falta?

Continuei meu caminho, nem sei quanto tempo faz que deixei aquele baile, não sinto saudades – aquela dança machucava-me os pés e eu insisti em baila-la por muito tempo até descobrir que poderia aprender outras.

As vezes fecho os olhos e penso naquele tempo perdido do próprio tempo, penso em você, nos seus olhos que estão se apagando diante dos meus, uma nevoa os cobrem, já nem sei ao certo qual a cor deles, castanho escuro, claro, cor de mel? Será que você ainda lembra dos meus?

Joguei as chaves daquela porta fora,

Escolhi ser eu, escolhi dançar minha própria música, ocupar o primeiro lugar na fila, ou melhor, escolhi sair da fila, escolhi ser única para poder ser muitas e conviver com muitos, escolhi ser a água que apaga minhas próprias labaredas antes que queimasse no “fogo” que eu mesma acendi.